Agripino e a tortura

Reproduzo a postagem do jornalista Paulo Moreira Leite sobre os posicionamentos políticos do senador Agripino Maia. Ao longo de sua história, os anais do Congresso brasileiro dificilmente terão registrado uma declaração tão repulsiva como as afirmações do senador Agripino Maia sobre a ministra Dilma Roussef. Ao acusar a ministra de mentir quando estava presa sob o regime militar, o senador deu a tortura a legitimidade de um teste de caráter. Transformou o porão que massacrava opositores num local onde vigoravam princípios como o respeito à verdade. No mundo inteiro, os torturadores gostam de culpar as vítimas pelos crimes que eles cometem. Seu comportamento mais freqüente é inverter os papéis para esconder a própria responsabilidade. Eles sustentam que a pessoa que responde a um interrogatório e dá informações após receber choques elétricos, porrada e ir para o pau-de-arara não é vítima de um crime, mas um cidadão com falha de caráter, um delator e um fraco. O ator de torturar, por esse raciocínio, não seria uma violência nem uma covardia, mas uma forma de se chegar à verdade. Esse raciocínio tenta dar a impressão de que há uma ética no porão, em que no fundo todos seriam iguais - o problema é que algumas vítimas são "corajosas", e outras, "covardes". Algumas teriam mais "saúde" para enfrentar os castigos e as outras seriam "pouco resistentes." A idéia, sempre, é transferir a responsabilidade para a vítima e apagar o papel do carrasco. Em 1970, o pai de um estudante preso pela Oban em São Paulo foi pedir satisfação a um capitão que comandava o destacamento. Ouviu o seguinte: "Seu filho está apenas levando socos e pontapés; mas isso não tem importância, porque também os levaria na faculdade. Está também levando choques elétricos, mas não se impressione porque os efeitos são meramente psicológicos." A pressa de amigos e aliados para tirar o senador de cena envolve um esforço teatral de sobrevivência. Mas era tarde. Com o pronunciamento, caiu a máscara de uma velha direita brasileira, que faz juras de amor à democracia por pura conveniência. Acho que o Senado Federal deveria seguir o exemplo de um juiz que tentou reeducar dois delinqüentes da internet, obrigando-os a ler Guimarães Rosa e Graciliano Ramos para saber como a vida é dura. Agripino Maia deveria ser obrigado a ler as 312 páginas do Brasil Nunca Mais, de onde tirei a citação acima. Talvez assim ele pudesse entender porque a Constituição brasileira define a तोर्तुरा

como crime hediondo - e tivesse dignidade na próxima vez em que fosse abrir a boca no Senado Federal. E você, tem alguma sugestão para reeducar o senador? Paulo Moreira Leite é jornalista e repórter do IG.

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